Perguntam-me não raras vezes:
- "Qual o livro de José Saramago que mais gostaste de ler?"
A resposta que pode ser dada a cada momento:
- "Impossível de dizer... não sei responder, não seria justo para com outros (livros) não nomeados. Mas uma coisa sempre soube. Uma obra de Saramago, enquanto "pseudo ser vivo" ou com "gente dentro" tem que me raptar, prender-me, não me deixar sair de dentro das suas páginas. Fazer de mim um refém, e só me libertar no final da leitura... mesmo ao chegar à última página. Aí, o "Eu" leitor que se mantém refém, liberta-se da "gente que a obra transporta dentro" e segue o seu caminho.
Mas segue um caminho que se faz caminhando, conjuntamente com mais uma família"

Rui Santos

sexta-feira, 23 de março de 2018

Recordação da passagem de José Saramago por Torres Novas ("Viagem a Portugal") e a menção ao melhor cabrito assado - via "mediotejo" (Cláudia Gameiro, 22/03/2018)

A reportagem de Cláudia Gameiro (22/03/2018), pode ser consultada aqui 
em http://www.mediotejo.net/torres-novas-ir-ao-cabrito-a-torres-novas-e-lembrar-uma-viagem-de-saramago-c-video/



"Torres Novas Ir ao cabrito a Torres Novas e lembrar uma viagem de Saramago"

"De 23 de março a 1 de abril decorre em Torres Novas, juntando 29 restaurantes, o Festival Gastronómico do Cabrito. Depois de 28 edições, este festival quer continuar a afirmar o que de melhor e mais típico é feito por terras torrejanas, potenciando-se um turismo que se quer cada vez mais integrado. Recordando a história deste projeto, tudo começou há mais de 30 anos, com alguma inspiração no livro “Viagem a Portugal” de José Saramago.

“O Viajante… pode aqui declarar que em Torres Novas conheceu, e disso se aproveitou, o mais maravilhoso cabrito assado de toda a sua vida. Como se chega a tal obra-prima de culinária não sabe o viajante, que nisso não é entendido. Porém, confia no seu paladar, que tem discernimentos de sábio infalível, se os há.”

José Saramago, in Viagem a Portugal (1981)

Entre outubro de 1979 e julho de 1980, José Saramago percorreu o país a convite do Círculo de Leitores, que comemorava na época o décimo aniversário da sua implantação em Portugal. Terá dito o autor, segundo a sinopse que apresenta a edição da Porto Editora, “após essa deambulação, misto de crónica, narrativa e recordações, que «o fim de uma viagem é apenas o começo de outra. É preciso ver o que não foi visto, ver outra vez o que se viu já, ver na primavera o que se vira no verão, ver de dia o que se viu de noite… É preciso voltar aos passos que foram dados, para os repetir, e para traçar caminhos novos»”.

Nesta sua “deambulação”, Saramago percorreu em boa verdade grande parte do território do Médio Tejo, tendo parado em Torres Novas e apreciado o que designou de “o mais maravilhoso cabrito assado de toda a sua vida”. A pequena passagem na obra terá servido, em parte, de inspiração para o projeto da Associação dos Amigos de Torres Novas de desenvolver uma Festival Gastronómico do Cabrito no concelho, que teve, entre outros promotores, Joaquim Rodrigues Bicho ou Luís de Sttau Monteiro.

Assim o narra João da Guia, antigo jornalista da Antena 1 e grande mentor do projeto, que conseguiu reunir na primeira edição do Festival um grande número de órgãos de comunicação social nacionais para a sua divulgação. A ideia subjacente a todo a iniciativa era levar o “cabrito a todos”, ricos e pobres, recordando-se o facto de que apesar de haver centenas de pastores no concelho em meados dos anos 80, poucos comiam efetivamente a carne dos cabritos, ficando apenas com as tripas e pequenas partes do animal.

João da Guia estava na Casa do Ribatejo em Lisboa quando o município de Torres Novas fez uma apresentação pública do Movimento de Intercoletividades de Torres Novas, uma iniciativa que uniu os vários quadrantes políticos locais para analisar os “problemas mais gritantes” do concelho e procurar soluções. “Que medidas a tomar?”, era a questão, em relação ao hospital, à poluição, ao rio almonda, à decadência do figo e à promoção turística.

Na sequência deste projeto, que coincidiu com a época da entrada de Portugal na União Europeia, narrou João da Guia ao mediotejo.net, constituiu-se a Associação dos Amigos de Torres Novas, pertencendo este ainda aos órgãos sociais. Foi esta associação que, em conjugação com a Câmara e a ACIS – Associação Empresarial de Torres Novas, Entroncamento, Alcanena e Golegã, criou o Festival Gastronómico do Cabrito, mas também a Feira dos Frutos Secos, que se realiza até hoje.

“Defender a gastronomia e a cabra torrrejana” foi um dos principais objetivos da associação com o festival gastronómico, salientando-se as características específicas deste animal criado na Serra d’Aire, cujo consumo de ervas aromáticas da serra, argumenta João da Guia, lhe dá um sabor muito particular. Acresce, adiantou o jornalista, que o cabrito integrava o primeiro símbolo da heráldica de Torres Novas, tendo-se encontrado também ossadas de cabrito no Castelo de Torres Novas. “A história do cabrito é já dos tempos muito antigos”, constatou, e quis-se preservar essa herança.

Defender a cabra serrana, as queijarias, incentivar a economia local ante a abertura de Portugal para a Europa foi na altura o motor do evento, mas também na perspetiva de levar o cabrito a toda a gente, deixando-se de o relacionar com um produto só para a elite. Procurou-se assim as antigas receitas, concluindo-se que o método de confeção mais tradicional era o cabrito assado no forno, com grelos e arroz de miúdos.

Outra das ideias que estive na base da inspiração do evento foi a passagem de José Saramago por Torres Novas no livro “Viagem a Portugal” e a referência de que comera o melhor cabrito da sua vida. João da Guia não se cansa de enumerar as várias figuras que se envolveram então com o projeto, numa época em que não havia assim tantos festivais gastronómicos e quando se procurava sobretudo potenciar a economia local.

Atualmente já poucos rebanhos há na serra, elogiando João da Guia o projeto do rebanho da Serra d’Aire que se encontra a ser desenvolvido pela junta do Pedrógão. Para Joaquim Cabral, vereador do turismo na Câmara de Torres Novas, o festival é para continuar, equacionando-se no futuro alargar inclusive o período temporal do evento.

Este ano os restaurantes aderentes – atingiu-se o número recorde de 29 – terão uma mesa com produtos locais e pequenos concertos musicais a acompanhar quem queira saborear o cabrito torrejano. Foi ainda lançado um Guia turístico de Torres Novas em inglês.

“Estamos a procurar articular estas coisas cada vez mais”, defendeu o vereador. Potenciar o turismo através de uma integração de tudo o que Torres Novas tem para oferecer, do Boquilobo à Gruta das Lapas, passando pela Serra d’Aire e as suas Pegadas dos Dinossáurios. “Interessa-nos harmonizar tudo de modo global para aumentar o turismo”, defendeu.

Segundo o autarca, Torres Novas registou em 2017 um total de 25 mil dormidas. Para o futuro prevê-se aumentar a oferta de rotas turísticas.

“Este evento representa uma homenagem ao cabrito de Torres Novas e ao próprio José Saramago”, comentou o presidente da Assembleia Municipal, José Trincão Marques, na apresentação do Festival, na sexta-feira, 16 de março. O autarca salientou a importância do turismo para o desenvolvimento local, destacando o papel da agricultura e da pecuária.

Torres Novas | Ir ao cabrito a Torres Novas e lembrar uma viagem de Saramago (c/vídeo)  
A Associação dos Amigos de Torres Novas esteve por trás da fundação do Festival do Cabrito, que pretendia potenciar a economia local e levar o cabrito a todos Foto: mediotejo.net
José Trincão Marques terminaria a sua intervenção a defender o presidente da Câmara, Pedro Ferreira, como o responsável que mais se preocupou com as questões ambientais, lançando o desafio do município se tornar a capital da preservação da natureza.

Já Pedro Ferreira, no mesmo evento, salientou a localização estratégia de Torres Novas e o seu “potencial riquíssimo”, referindo que o festival do cabrito é uma homenagem aos antepassados. Agradeceria assim a João da Guia o trabalho desenvolvido em prol de Torres Novas, mas também ao presidente da junta de freguesia do Pedrógão pelo exemplo dado com o rebanho de cabras da Serra d’Aire."

José Luís Peixoto: "Pessoa y Saramago abrieron las puertas que aún usamos" ao "El Espectador" (16/03)

José Luís Peixoto: "Pessoa y Saramago abrieron las puertas que aún usamos", de Cynthia de Benito (EFE, 16/03/2018) aqui,
em https://www.elespectador.com/noticias/cultura/jose-luis-peixoto-pessoa-y-saramago-abrieron-las-puertas-que-aun-usamos-articulo-744805

"El escritor portugués José Luís Peixoto, una de las plumas más destacadas de su generación, está convencido de que la literatura lusa vive un buen momento en España y América Latina gracias a las puertas que abrieron Fernando Pessoa o José Saramago y que su compañeros, dice a Efe, "aún" usan."

"el escritor José Luis Peixoto, quien anuncia que 
estará en la Feria del libro de Bogotá, el próximo mes. Getty images"


"Es parte de la llamada "herencia recibida" de la que gozan contemporáneos como él que, sostiene, cuentan con referencias ante las cuales se debe "estar a la altura" y "puertas abiertas" en todo el mundo que "aún son utilizadas" por escritores de su generación.

"Siento que algo común a esta generación de autores es no gritar una ruptura con lo anterior, no 'asesinar al padre', porque siento que estamos cómodos con esa herencia", agrega en una entrevista con Efe en Funchal, capital del archipiélago luso de Madeira, durante el Festival Literario que se celebra en la isla. (Lea: El evangelio según Saramago)

Allí, el autor de "Galveias" o "Te me moriste" ha participado en una charla sobre los objetivos de la literatura, actividad que a su juicio "tiene siempre una dimensión política social".

Peixoto (Galveias, 1974) ha dado constantes muestras de ello en sus novelas, frecuentemente ambientadas en el mundo rural portugués y con abundantes elementos biográficos, pues él mismo no llegó a la ciudad hasta los 18 años, cuando se marchó a estudiar a Lisboa. Su interés por el interior del país le ha valido un buen número de premios -llegó a ser el vencedor más joven de la historia del Premio José Saramago por "Nadie nos mira"-, y una suerte de fama como retratista de las aldeas lusas, a las que solo ha apartado para abordar desde la "no-ficción" Corea del Norte o Tailandia.

Pero ahora Peixoto, que se resiste entre risas a aceptar que sea considerado el sucesor de Saramago ("entiendo esas palabras como un gran elogio, pero sé que nunca podría ser efectivamente su continuador") se siente impelido a regresar a la ficción.

"Estoy escribiendo una novela en que la ficción está más presente, aunque como en otros libros también me gusta y me parece interesante jugar con la autobiografía", comenta Peixoto, que se niega a desvelar nada más.

El escritor comenzó con la poesía, se pasó a la narrativa y, tras su inmersión en la no ficción (que fue todo un "desafío"), concluye que es "bueno atravesar fronteras" entre lo biográfico -y por tanto real- y la ficción, tendencia que considera "muy contemporánea".

En cualquier caso, también es relevante ejercer el "compromiso social", algo con lo que se siente muy identificado este autor, que emplea un tono sereno y tiene siempre la risa pronta a surgir.

"Cualquier escritor cuando escribe está ejerciendo su compromiso social porque está colocando en el texto gran cantidad de convicciones, incluso formales, que son también un mensaje, una idea transmitida a los otros que tiene su impacto y sus consecuencias", subraya.

El tema sobre el que él ejerce presión son las relaciones de familia y los roles dentro de ella, pero también "la ruralidad", un asunto que lejos de ser exclusivo de Portugal es "un problema incluso en cierta medida ibérico".

"He escrito bastante sobre el mundo rural, tiene mucha importancia escoger ese tema. Creo que los autores pueden llamar la atención para un determinado tema, y creo que es muy relevante hablar de eso en Portugal. Existen desequilibrios muy importantes en diversos aspectos de ese territorio", sostiene.

Lo sucedido el año pasado en el interior de Portugal, donde murieron más de 100 personas en incendios, "fue muy traumático" para el país, apunta Peixoto, que cree necesaria una visión a largo plazo no solo para reconstruir, sino para afrontar los retos de la zona.

Mientras, sus novelas, que hablan de la vida en Galveias o reconstruyen las relaciones madre e hija en torno a la aparición de la Virgen de Fátima hace un siglo, viven su mejor momento de expansión, con varias publicaciones el año pasado en México, Perú o Venezuela. Peixoto planea publicar pronto también Cuba.

El periplo se completa con su presencia en la próxima edición de la Feria del Libro de Bogotá, tras haber publicado tres novelas en Colombia. "Para mí es fantástico, porque siento que hay un interés y curiosidad por la literatura portuguesa contemporánea en esos países, que es muy sorprendente para mí, pero que creo que tiene que ver con la forma en que fueron abiertas las puertas por Saramago, un autor que era y continua siendo muy leído en esos países", sugiere.

Es también un indicador, dice, de cómo Portugal tiene "muchas veces más identificación con América Latina que dentro de la propia Europa, de la cual supuestamente formamos parte"."